'Em um mundo interior': O que aprendemos com o documentário sobre autismo no Brasil

O filme foi lançado durante o Festival É Tudo Verdade, em maio, e segue em cartaz nos cinemas em circuito nacional.


Durante dois anos, os cineastas Flavio Frederico e Mariana Pamplona mergulharam na rotina de 7 famílias em diversas cidades do Brasil. O motivo? Conhecer e compreender como é a rotina de uma criança autista em nosso País.

O resultado dessa pesquisa é o documentário sobre autismo feito no País. Em um mundo interior busca contar parte dessa história e discutir os caminhos para a inclusão das crianças autistas na sociedade.

Ao contrário do que o HuffPost Brasil disse na primeira versão deste texto, existem outros longa metragens que abordam o tema, como o filme Arthur e o infinito, um olhar sobre o Autismo.

O documentário foi lançado durante o Festival É Tudo Verdade, em maio, e segue em cartaz nos cinemas em circuito nacional.

No Brasil, o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) atinge cerca de 2 milhões de pessoas em maior ou menor grau, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS).

O diagnóstico é feito por análise clínica, com muita observação e atenção em relação ao desenvolvimento da criança. Por não ter um quadro fechado de tratamento e sintomas, ele segue sendo considerado uma das mais enigmáticas desordens neurológicas.


Nós, os típicos, somos muito mais próximos deles do que a gente imagina. A gente se reconheceu neles diversas vezes, e acho que esse foi o grande aprendizado do filme. A nossa proximidade, apesar da grande diferença.
Flavio Frederico, diretor


Em entrevista ao HuffPost Brasil, os diretores Flavio Frederico e Mariana Pamplona compartilharam os detalhes desse mergulho na rotina do autismo.

HuffPost Brasil: Qual a importância de fazer um filme documentário sobre o tema?

Mariana Pamplona: A ideia do documentário nasceu de uma vontade minha antiga de falar sobre crianças que foram obrigas a superar obstáculos para estar no mundo. Como o autismo não tem cura, não tem causas definidas, só existem hipóteses sobre o seu tratamento. Outro ponto que é interessante é que o espectro do autismo é muito amplo. Existem casos gravíssimos e outros bem mais leves. Nenhum autista é igual ao outro. As pessoas de um modo geral não sabem o que é o autismo e como lidar com ele. O filme quer contribuir para que as pessoas possam entender, se relacionar e perceber que nã é um bicho-de-sete-cabeças. Essas crianças precisam ser incluídas na sociedade.

O filme é uma ferramenta para que a sociedade se aproxime desse tema e desenvolva empatia. Incluir o autista não é uma experiência rica só para ele, mas também para a criança típica. É um aprendizado de respeitar e acolher o diferente. As pessoas precisam entender a importância disso e o Estado precisa capacitar cada vez mais profissionais nas instituições que possam acolher essas crianças.

Como se deu a escolha do título do filme, Em um mundo interior?

Mariana Pamplona: Os autistas são tidos como pessoas que vivem em um mundo próprio deles. Mas não é bem assim. Existem muitos canais de comunicação com essas crianças. Mas é preciso descobrir como abrir esses canais. O estereotipo de que os autistas são frios é um mito. Eles têm uma dificuldade de se relacionar, de usar a linguagem, de se comunicar. Mas eles não são frios, pelo contrário, a gente encontrou muito calor nessa troca. E o mundo exterior deve acolher esse mundo interior.

Vocês passaram dois anos convivendo com esse projeto e compartilhando a intimidade dessas famílias. O que aprenderam nesse processo?

Flavio Frederico: Foi uma experiência única. No início do projeto a gente estava receoso em como a gente seria recebido na casa dessas famílias. E a gente precisava entrar nesse mundo para compreender como essas crianças vivem.

A pesquisa para achar esses personagens foi um processo longo no documentário. Queríamos retratar personagens diversos, crianças de vários graus de autismo, de diferentes classes sociais e cidades. As famílias receberam a equipe reduzida, com equipamentos leves, para incomodar o mínimo possível. Isso demonstrou para a gente que se a sociedade tiver essa postura, de escutar mais, tentar compreender o outro que pensa totalmente diferente, que encara a realidade diferente, dá certo.

A gente aprendeu com o autista e com sua visão de mundo. Nós, os típicos, somos muito mais próximos deles do que a gente imagina. A gente se reconheceu neles diversas vezes, e acho que esse foi o grande aprendizado do filme. A nossa proximidade, apesar da grande diferença.

Em determinadas cenas do filme, vocês entregam câmeras para que as crianças possam gravar imagens sozinhas. Como foi essa experiência?

Mariana Pamplona: A gente não sabia se essa ideia ia dar certo. Algumas crianças simplesmente ignoraram a câmera. Mas a Julia e o Igor fizeram imagens. Utilizamos essas cenas no filme porque por meio desse processo a gente tentou entender como eles veem o mundo.

Como fugir do sentimento de vitimização ao tratar do tema?

Mariana Pamplona: Era muito importante para a gente escolher famílias que estivessem 100% dispostas a essa exposição. Porque é uma exposição você abrir sua casa e mostrar o seu filho. As famílias que ficaram mais distantes ou demonstraram algum receio, a gente não forçou a barra e não incluiu no filme. A família tem que estar afim de receber essa equipe, por mais que seja uma equipe menor e respeitosa.

Ao escolher as crianças pensamos que, por mais grave que o caso fosse, nós queríamos que elas estivessem em um processo de evolução. Em um processo em que as terapias que eles estivessem fazendo estivessem dando resultado, não importa qual a linha que fosse essas terapias.

A gente fez questão de destacar esse lado positivo. O autismo não tem cura, mas existem terapias em que é possível melhorar muito as condições de vida dessas crianças. A gente sabe que é uma realidade difícil. Não é uma delícia ser autista, nem para a criança nem para a família. Mas ter uma autista em casa te possibilita a ter uma vida incrível. E essas crianças tem que frequentar escola, fazer terapias, melhorar sua sociabilidade, andar, falar, enfim, fazer tudo.

Conviver com os pais dessas crianças foi incrível. As crianças são fortes e esses pais são fortalezas.Todo esse processo da rotina do autismo é cansativo. E esses pais enfrentam isso com muita garra e muita fé de que estão fazendo o melhor pra seus filhos. Foi lindo de ver.

Matéria feita por :huffpostbrasil.com

Categoria:Notícias

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